"NINGUÉM DERROTA A MORTE SEM MATAR-SE"

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A Toca do Coelho

"Quem, de três milênios,
Não é capaz de se dar conta
Vive na ignorância, na sombra,
À mercê dos dias, do tempo."

Goethe

quinta-feira, 19 de julho de 2012

Gosto da palavra plena
a palavra crua
a palavra desprovida de
sentido e significado
a palavra intensa
significante
com intensão
tensão tesão
preenchida de
cor som cheiro textura
a palavra
densa
a palavra madura.

sábado, 2 de junho de 2012

Pensando em você

É possível esquecer? Pergunto. É possível deixar de amar? "Que pode o ser amoroso sozinho em rotação universal senão rodar também, e amar?"

Mesmo em meio mais absoluta distância e silêncio, com a mais intrépida força de sobreviver e corajoso otimismo de recomeçar, eu ainda quero te contar daquela matéria boba e cheia de erros ortográficos que saiu no Segundo Caderno; do pneu que cantou hoje na avenida por onde passo pra ir trabalhar (e que medo que me deu!) ;  Ah! Do pote de vidro com calda de pudim que o gato derrubou no chão por conta do susto com a salva de fogos quando o Flamengo finalmente fez um gol ; daquela aula onde as crianças decidiram o que querem ser quando crescer, e cresceram;  do poeta que resolvi ser hoje por causa da lua...

Já desisti. Não vou desistir.


Estou pensando em você.




quinta-feira, 10 de maio de 2012

Dor de Menino

Otro dia meu irmão
Deu é pra chorá
Mai num dexô ninguém drumi
Feiz todo mundo acordá

O zum-zum-zum envolta dele
Mai ninguém adivinhava
Por que tanto chororô
O menino num parava

As tia véia vei dá pitaco:

"Num é dor de cabeça?"
"Num é dor de barriga?"
"Ai que tanta dor um nenê pode ter
em tão pouco tempo de vida?"

A vó:

"Ocês pára de grosseria
Num se trata assim ninguém
Inda mais que dor nessa vida
Todo mundo tem

É dor de parto, dor de ouvido
dor de dente, dor de viado
dor de corno nos marido
de cotovelo nos apaixonado

Deu sór, dói os ói
Deu chuva, dói os osso
Ih, dói o peito nas vitória
e lá no fundo do poço

Que a dor faz parte da vida, meu fio
E cria caráter no sujeito
Nuns deixa o coro macio
Cum otros, num tem jeito

As dor vai sempre ixisti
Quer num quera, quer goste
Mió é num resisti
Que gripe num dá em poste."

Inquanto a vó falava
O nenê adormeceu
I só intão arreparei
No que foi que sucedeu 

O menino, tava nascendo os dente
I o pobre num podia falá
Como é que ele ia dizê o que sente
A num ser dá pra chorar

Aí eu entendi que a dor vem das ferida
Que abre quando a gente veve
Seja véio seja novo
A vida sempre deve.


Nathalia Colón

sexta-feira, 20 de abril de 2012

Cacete!!!



Receita de pizza


Dissolva dois tabletes de hipocrisia
numa porção de promessas não cumpridas.
Acrescente uma xícara e meia
de descaso e oportunismo.
Tempere com caixa dois à gosto
e não esqueça de rechear bem os bolsos
com bastante dinheiro público.
Leve ao Congresso por tempo indeterminado
e você terá todo o sabor
do político tipicamente brasileiro.


José Calazans

domingo, 8 de abril de 2012

E os dias se arrastam...

e as manhãs chegam
e as noites pulam
e a hora é do almoço
e o labor é tempo
e o prazer repousa

e os dias se arrastam...

e as manhãs pulam
e as noites repousam
e a hora é do tempo
e o labor chega
e o prazer é do almoço

os dias se arrastam...

e as manhãs repousam
e os noites chegam
e a hora pula
e o labor é do almoço
e o prazer é do tempo.

Nathalia Colón







sexta-feira, 6 de abril de 2012

TUDO BEM - Uma proposta absurda

( Um homem e uma mulher estão sentados num banco à espera. Há um balcão no canto esquerdo vazio)

Mulher: Tudo bem?
Homem: Tudo bem. E você? Tudo bem?
Mulher: Ah! Tudo bem!
(Silêncio)
Homem: Ah! Já ia me esquecendo! Como é que você tá?
Mulher: Tudo bem. E você? Tudo bem?
Homem: Tudo bem.
(Silêncio)
Homem: Você emagreceu, né?
Mulher: Imagina! Nem uma grama. Perdi 20kg.
Homem: Jura? Nem notei. Eu perdi 20anos.
Mulher: Esses regimes...!
(Silêncio)
Mulher: E, como é que andam as coisas?
Homem: Tu...
Mulher: Tudo bem!
Homem. Sim! Tudo bem! E você?
Mulher: Tu...
Homem: Tudo bem!
(silêncio)
Homem: Será que chove?
Mulher: Não. Já choveu.
Homem: Quando?
Mulher: Ano Passado.
Homem: Ah! Sim...
Mulher: Lembra?
Homem: Se lembro. Foi uma chuva linda! Meu marido morreu.
Mulher: Jura? Que lindo! E quando vai ser o velório?
Homem: Foi assim que meu filho nasceu.
Mulher: O velório?
Homem: Não. A chuva.
Mulher: Ah! Entendi.
( Trovão. Começa a chover.)
Mulher: Hum... acho que está na hora.
(O casal troca anéis. A mulher se levanta e caminha para o balcão. Uma balconista que nunca tira o sorriso do rosto aparece.)
Homem: Beijo, tchau.

Mulher: Eu trouxe tudo: Identidade, CPF, comprovante de residência, certidão de nascimento, atestado de óbito, quatro fotos 3x4 e um acompanhante.
Balconista: Qual é o seu número?
Mulher Trinta e sete.
( Mulher tira os sapatos e entrega a balconista. A balconista guarda dentro de uma caixa. Confere os documentos.)
Mulher: Tudo bem?
Balconista: Tudo bem! A senhora já pode ir morrer. Basta entrar naquela salinha à esquerda. A que está acesa.
Mulher: Obrigada! (Caminha para a coxia da direita.)
Balconista: Senhora! Sua testemunha. Ela deve te acompanhar. Normas da empresa.
Mulher: Tudo bem. Vamos? ( Para Homem. O Homem se levanta e os dois caminham.)
Balconista: Senhora!
(O casal pára. Os dois se viram.)
Balconista: Seu comprovante.
Mulher: Ah! Claro.
Balconista: Normas da empresa.
Mulher: Tudo bem.
Homem (para mulher): Tudo bem?
Mulher: Tudo bem.
(Os dois caminham de braços dados e devagar para a coxia. Apaga o banco, apaga o balcão.) Fim.

Nathalia Colón



domingo, 1 de abril de 2012

Gatos de Raça e a Inversão da Pirâmide de Maslow



Que o Brasil é um país que pouco incentiva a cultura, o mundo todo sabe. Que as leis de incentivo são um mero instrumento de censura de manipulação de recursos, já estamos cansador de ouvir. Que a maioria dos editais de já tem destino certo e os patrocínios fazem parte de um jogo entre uma pequena parcela da classe artística, dã! Novidade...

Então, se você não é um afortunado, ou não faz parte de um nicho privilegiado, como se promove cultura neste país? E... por que?

Minha resposta: raça.

Segundo Maslow e sua Pirâmide da hierarquia de necessidades humanas, as artes ocupariam o último nível, "Realização Pessoal", sendo, portanto,  a última das prioridades antropológicas. Depois de casa, comida, segurança e afetos, o último dos interesses na existência e na condição humana.

Não tenho a menor pretensão de desmentir um trabalho fundamental e tão sério, mas eu não sou a única que contesta, ao menos, o determinismo desta teoria. Eu mesma não a estudei por completo, mas me incomoda um pouco pensar que o sentido da nossa existência, esteja ligada quase que em sua totalidade, à sobrevivência, ao respirar, ao bater do coração, ao simples exercício saudável das funções fisiológicas. Tipo, viver para estar vivo e esperar a hora de morrer.

O que levaria então um homem a passar fome e não ter sequer onde morar, para poder pintar. Que impulso conduz uma pessoa a romper com toda a estabilidade que a vida pode lhe proporcionar em vista da possibilidade de fazer música. De onde vem esta força, visceral que inverte a pirâmide e presenteia a história de legados como de Van Gogh, Monet, Shakespeare, Francisco de Assis, Dostoiévski, entre muito outros.

Contraditoriamente a sociedade impele, mesmo por meio das dificuldades o surgimento das luzes de sua evolução. Os que abrem caminhos, expandem fronteiras e fazem a vida parecer ter um pouco de sentido  são os que roem a realidade para nos conduzir ao ideal. São, segundo Roberto Freire, promutantes, dotados de um gene de uma raça bem específica. Homanóides que nascem precocemente, e andam por aí, invertendo pirâmides e conduzindo revoluções. Sua característica mais notável: a  raça.

Dedico este despretensioso desabafo aos meus parceiros de cena. Gatos de raça, de rua, de vanguarda.

Valeu, Marquinho!
Valeu, João!

VALEU, GATARIA!





sexta-feira, 23 de março de 2012

Se eu morrer novo...

Se eu morrer novo,
Sem poder publicar livro nenhum,
Sem ver a cara que têm os meus versos em letra
impressa,
Peço que, se se quiserem ralar por minha causa,
Que não se ralem.
Se assim aconteceu, assim está certo

Mesmo que os meus versos nunca sejam impressos,
Eles lá terão a sua beleza, se forem belos.
Mas eles não podem ser belos e ficar por imprimir,
Porque as raízes podem estar debaixo da terra
Mas as flores florescem ao ar livre e à vista.
Tem que ser assim por força. Nada o pode impedir.

Se eu morrer muito novo, ouçam isto:
Nunca fui senão um criança que brincava.
Fui gentio como o sol e a água,
De uma religião universal que só os homens não têm.
Fui feliz porque não pedi coisa nenhuma,
Nem procurei achar nada,
Nem achei que houvesse mais explicação
Que a palavra explicação não ter sentido nenhum.

Não desejei senão estar ao sol ou à chuva -
Ao sol quando havia sol
E à chuva quando estava chovendo
( E nunca a outra coisa),
Sentir calor e frio e vento,
E não ir mais longe.

Uma vez amei, julguei que me amariam,
Mas não fui amado.
Não fui amado pela única grande razão -
Porque não tinha que ser.

Consolei-me voltando ao sol e à chuva,
E sentando-me outra vez à porta de casa.
Os campos, afinal, não são tão verdes para os que
são amados
Como para os que o não são.
Sentir é estar distraído.

Fernando Pessoa

sexta-feira, 2 de março de 2012

O nômade

Hoje entrei no Facebook e havia atualizações de uma amiga que não vejo há quase dez anos. Senti o desejo de saber como anda sua vida, o que tem feito, por onde tem andado... Vi algumas fotos dentre umas trezentas. Festas, formaturas, casamentos, crianças, encontrões, viagens...

Lembro-me da época em que estudávamos juntas. Lembro-me da época em que tínhamos tanto em comum. Eu nunca pertenci a grupo nenhum. Nunca fui de nenhum núcleo ou panelinha por muito tempo. Não sei porque. Era certo que cedo ou tarde eu trocaria de grupo. Visitaria outros, de uma forma bem nômade mesmo. E chegava no próximo como se conhecesse todos há milênios. Eles me enjoavam, era uma questão de tempo. Não demorava muito pra entender intuitivamente a psique daquele ensaio e ir embora, começar de novo, outro bando.

Vendo as fotos da minha amiga, reencontrei pessoas que eu nem lembrava que haviam passado pela minha vida. Foi bom vê-los. Seus rostinhos um pouco mais amadurecidos, se abraçando, curtindo essa amizade longeva, em ritos festivos periódicos. E mais uma vez me enjoei. Até caí por um instante na armadilha do arrependimento e da culpa de não ter cultivado, me integrado mais a eles. Mas logo vi que eu não poderia. São boa gente, mas não poderia estar com eles sem olhar o relógio e contar os segundos para ir embora, sem ouvir seus dilemas existências rasos e não me entediar, sem sentir náuseas ao posar para fotografias ensaiadas. Eu não poderia. Não pude. Não posso.

Mas, isso é um problema meu. Isolamento e tal, isso é meu. O lance, é que eu achava, eu realmente acreditava que essa galera, meus colegas de bando, tinham autenticidade, personalidade, tinham voz. Diferente de mim, que ironicamente, sempre me mesclei desde as patricinhas até os grunges. Embora eu não me interesse pelas suas vidas, é um pouco frustrante ver como tudo terminou. Sim. Eles não sabem, mas terminou. Terminou tudo numa grande e imensurável manada.

Nathalia Colón

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Receita de Homem (detalhes)



Os muito retos que me perdoem
Mas ser gauche é fundamental

É preciso que haja
Qualquer coisa de sol em tudo isso
Qualquer coisa de surf
Qualquer coisa de circo em tudo isso
Ou então
Que o homem aprenda a imprimir  o
Arquétipo do “great pretender” como
Nos bailes dos anos cinqüenta

Não há meio termo possível
É preciso que isso tudo seja errante


É preciso que os ombros emerjam do tórax numa envergadura
Semelhante de uma ave
E que sustentem uma postura moral indomável lapidando
uma escultura que lembre não menos
que a avidez de uma vela mestra pronta para navegar  com vento de través.

é preciso que a imagem das mãos delongue-se
para além do ante-braço, numa união tão contínua e insolúvel
cuja expectativa seja de um artefato habilidoso
tão minuciosamente forjado em vista de eventual emprego cirúrgico

e que exista em grande latifúndio dorsal

A pele deve ser seca nas mãos, nos braços,
no dorso e na face
Mas que as concavidades e proeminências sejam
úmidas, lúbricas
e no crescente da paixão permitam-se deslizar
rumo a horizontes improváveis

Sobremodo pertinente
É Que o homem não seja carente mas
Caliente
Que haja um canto delirante nos olhos
em reviravoltas e devaneios de paixão
pernas semoventes quando do enlace pelas pontas pélvicas de anima
que nos ouça o inaudível canto da combustão
E que ele não lembre nunca um circo sem magia
E a que a virilidade não seja mais
que o reflexo mais atraente de seus mais óbvios temores

Gravíssimo, porém, é problema dos pelos
Um homem sem pelos é como um solo desmatado

Que ele venha, não surja
Que vá, não parta.
e que erre
erre durante  sete dias
com a propriedade de um deus criador
e sem covardia
nos faça fiéis de sua fé errante e
beber do cálice sagrado da perdição

E que em sua incalculável imperfeição
Constitua a coisa mais bela
E mais perfeita de toda a criação
Inumerável.

Nathalia Colón

domingo, 15 de janeiro de 2012

A bailarina

Ela dança
a mulher
no meio dos passantes estranhos
qualquer tipo de música
balança os braços em
diferentes ritmos e
as pernas
lindas (mas não posso vê-las)
num estilo próprio, próspero
progressivo
pop, rock, balada
tango, mambo, salsa de cassino
no meio da feira
seus dentes também dançam
Lá fora está quente (ela também)
Lá fora, o caos (ela também)
Lá fora, estilhaços da guerra
ela também
gira, linda, gira,
clandestina
Em meios aos sonhos alheios
de morte, guerra e dança.

Nathalia Colón

(para a logista bailarina do Cassino Atlântico)

Aulas de Teatro



"Somos  todos atoresteatro é algo que existe  dentro de cada ser humano e pode ser praticado em qualquer lugaraté mesmo dentro dos teatros.” (Augusto Boal)