"NINGUÉM DERROTA A MORTE SEM MATAR-SE"

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A Toca do Coelho

"Quem, de três milênios,
Não é capaz de se dar conta
Vive na ignorância, na sombra,
À mercê dos dias, do tempo."

Goethe

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Ontologia Sumaríssima

Umas quatro ou cinco coisas,
no máximo, são reais.
A primeira é só um gás
que provoca a sensação
de que existe no mundo
uma profusão de coisas.

A segunda é comprida,
aguda, dura e sem cor.
Sua única serventia
é instaurar a dor.

A terceira é redondinha,
macia, lisa, translúcida,
e mais frágil do que espuma.
Não serve para coisa alguma.

A quarta é escura e viscosa,
como uma tinta. Ela ocupa
todo e qualquer espaço
onde não se encontre a quinta
(se é que existe mesmo a quinta)

A qual é uma vaga suspeita
de que as quatro acima arroladas
sejam tudo o que resta
de alguma coisa malfeita
torta e mal-ajambrada
que há muito já apodreceu.

Fora essas quatro ou cinco
não há nada,
nem tu, leitor,
nem eu.



Paulo Herriques Britto

Um comentário:

  1. Esse poema é extremamente instigante!
    maravilhoso.

    a sensação que tinha com a quinta coisa (e que tive na primeira leitura novamente), é que se tratava de uma dúvida sobre as quatro coisas de cima...

    Como se não existissem nem mesmo estas.

    Mas numa leitura mais fiel ao texto, não é essa a dúvida... a quint'essência é a dúvida de se essas quatro coisas são o resto de uma coisa mal feita.

    Não sendo a quinta real, então as quatro coisas não são o "apodrecimento" deste algo mal feito; mas sim a realidade prévia eterna.

    a questão, então, é se houve algo de não podre previamente... ou se a podridão sempre esteve.

    Essa quinta coisa é importante de saber... oxalá aponte para onde voltar....

    voltar?

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